Orgulho de ser mulher negra, lésbica na política.

O texto autoral trás a trajetória politica de uma militante dos direitos humanos e da causa LGBT na Bahia e no Brasil.

SOCIEDADE

Lívia Ferreira

6/30/20225 min ler

No final década de 60 e com a grandiosa “Revolta de Stonewall, nos Estados Unidos, os direitos de travestis, de gays e lésbicas, trouxe a autoestima e afirmação de quem somos e do orgulho de ser, daí surgiram diversas iniciativas internacional e nacional em defesa das nossas vidas, no Brasil tivemos a criação do Grupo SOMOS, GGB, algumas publicações como o Jornal CHANA COM CHANA, em que nós mulheres Lésbicas distribuíamos em uns dos Bares (Ferros Bar) de São Paulo, onde aconteceu perseguição e muita luta (Stonewall brasileiro), ao conhecer e validar a nossa história, consigo vislumbrar o 1º SENALE/1996 (Seminário Nacional de Lésbicas) idealizado por Neuza das Dores, preta lésbica, que ao lado de outras mulheres teve a coragem de trazer a pauta de garantir, e ampliar direitos, fomentar políticas públicas, favorecer representação política e de poder das Lesbianidades.

A nossa luta se entrelaça com a nossa Constituição Federal na garantia da, soberania e hegemonia, para a garantia dos direitos, civis, políticos e sociais já conquistados. Ter em vista o contraponto que durante a ditadura militar a população LGBTI+ foi perseguida, caçada e torturada, devido a sua Identidade de Gênero e Orientação Sexual, pois destoava da máxima moral e bons costumes da família heteorpatriarcal, capitalista. Com a luta da População e movimentos sociais houve avanços significativos a partir de 2003, com a retomada da DEMOCRACIA, governo popular que escutou a sociedade e através da criação de Secretárias de Direitos Humanos, Igualdade Racial e Políticas para Mulheres, transversalizou as pautas de grande importância. Agendas inegociáveis antimachista, antiracista, antisexista, antilgbtfóbica. Momento memorável na nossa história.

As conquistas foram muitas, 2004 foi criado o Programa Brasil Sem Homofobia, 2008 aconteceu a Primeira Conferência Nacional LGBTI+, com o valoroso resultado do Plano Nacional de Promoção da Cidadania e dos Direitos LGBTI+, 2009/Junho LEI 11.958 Institui a Coordenação Geral de Políticas Públicas LGBTI+, 2011 Cria-se o Conselho Nacional de Combate a Discriminação e Promoção dos Direitos LGBTI+, reconhecimento da união estável, inclusão dos itens, orientação sexual. Identidade de Gênero e nome social nos boletins de ocorrência.

Hoje, conseguimos outros avanços que de certa forma não veio pela Câmara Federal e decreto presidencial, mas sim pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e STF ( Supremo Tribunal Federal).

OCUPAÇÃO DE ESPAÇOS POLÍTICOS

A participação de pessoas LGBTI+ na política ainda é mínima, quando comparada com os demais grupos reivindicatórios. Com uma comunidade de cerca de 10% da população brasileira, entende-se que a representação deve ser maior, possibilitando assim o debate de pautas específicas da comunidade LGBTI+. Mesmo com um aumento crescente, é importante que pessoas hetero aliadas façam a defesa da causa por conta da dificuldade de acesso aos poderes de modificação da sociedade. Mas percebo que a nossa presença no processo eleitoral é fundamental, pois a nossa representação tem um valor inestimável, imensurável, na busca das alianças e desenvolvimento para humanização e legalidade das nossas pautas. Em 2020 coloquei o meu nome disponível para uma candidatura coletiva Lésbica, Gay e e uma Transsexual, não tivemos votos suficientes, porém, foi incrível, aprendi, ensinei, construi, chorei, sorri e peguei muito gosto pela oportunidade de concorrer nesse processo eleitoral.

Verifiquei os diversos desafios enfrentados pela nossa candidatura, que me fez pensar de que forma combatê-los: a falta de investimento, comprometer pessoas de fato para a nossa inserção na Câmara Municipal, conhecer, pensar e discutir a cidade, exigir ou criar uma equipe da sua campanha com o máximo de antecedência (voluntária e profissional), ter recursos financeiros disponíveis, ter redes de apoio, tudo isso visando o engajamento e responsabilidade e o triunfo nas urnas. Observei que disponibilizar os nossos nomes para campanha é lutar contra o sistema opressor, arcaico, heteronormativo, patriarcal, racista, sexista, misógino que é um sistema estrutural em que o Capitalismo faz estragos, sem se preocupar com o bem viver da população em geral. Sabemos que existe alguns tópicos que precisamos falar, pois abalou demais as nossas candidaturas e a vida da nossa população, segue abaixo:

DAS FAKE NEWS CONTRA A POPULAÇÃO LGBT

Um dos assuntos mais polêmicos para quem não tem conhecimento sobre a causa LGBTI+ é a chamada “ideologia de gênero”, que foi criada com a ideia errônea e absurda de que ativistas de direitos humanos, educadores, educadoras intencionavam, propositalmente, hipersexualizar as crianças, levando-as a transformar seu gênero de forma impositiva. A propagação na mídia dessa expressão tem sido utilizada como tática de poder, com o objetivo de colocar a comunidade LGBTI+ como criminosa, numa tentativa de desmoralizar a nossa luta e vulnerabilizar os nossos corpos e corpas.

DA POPULAÇÃO LGBTI+ NEGRA

Nas políticas de igualdade racial, devemos promover um olhar voltado às especificidades da população LGBT, incentivando a discussão da pauta junto a Conselhos, Comissões, Grupos de Trabalho etc., visando promover a inclusão social e diminuir a violência contra a população LGBT negra.

DOS DIREITOS SOCIAIS

O Estado brasileiro tem o dever de garantir a todas e todos os direitos sociais. No entanto, não é o que acontece com a maioria da população LGBT no Brasil. Para tanto, tendo como base a isonomia, a jurisprudência e a equidade, deve promover direitos igualitários, para minimizar o alto grau de vulnerabilidade e marginalização a diferentes contextos que a população LGBT é submetida.

DO DIREITO À EDUCAÇÃO

Os temas “gênero” e “sexualidade” precisam ser inseridos no currículo escolar de forma efetiva, do ensino fundamental ao superior e que também sejam produzidos materiais didáticos, para que educadoras e educadores possam promover debates em sala de aula de modo apropriado e produtivo.

A população LGBT ainda sofre diversas violências quando adentra a educação formal, do ensino fundamental ao superior, por isso é dever do Estado promover políticas de permanência e/ou inclusão de pessoas LGBT, como formas de diminuir a evasão/expulsão escolar.

DA SAÚDE INTEGRAL DA POPULAÇÃO LGBT

O atendimento à população LGBT em Unidades Básicas de Saúde ainda é uma realidade precária, pois não há a equidade, oportunidade e o respeito às especificidades dessas pessoas. Nos últimos anos, a negligência do Estado em promover a prevenção e combate de HIV/AIDS, IST e Hepatites virais têm sido uma constante, devendo ser observados os boletins epidemiológicos divulgados pelo Ministério da Saúde. Os Ambulatórios Especializados para Travestis, Transexuais e Transgêneros e Intersexos, devem ser instituídos no âmbito das Secretarias de Saúde, com os atendimentos de profissionais em Psicologia, Psiquiatria, Serviço Social e Endocrinologia, urologia e ginecologia e ainda realizar o processo transexualizador, por meio do Sistema Único de Saúde. Outro desafio de saúde é o suicídio de pessoas LGBTI+, que têm uma alta taxa de ocorrências, quando não são respeitadas na sua condição e na medida em que a morte social pela falta de acesso à educação, trabalho, renda e moradia leva à morte física.

DO DIREITO À MORADIA

Uma das maiores dificuldades vivenciadas hoje pela comunidade LGBTI+ é o acesso ao direito à moradia, diante da triste realidade de que muitas pessoas LGBT são retiradas de suas famílias de forma brutal. Diante disso, é necessária a incorporação da união homoafetiva, enquanto unidade familiar nos programas habitacionais, para que essas pessoas tenham esse direito resguardado.

DO TRABALHO E RENDA

Existe um grande deficit nas vidas das pessoas LGBTI, a formação profissional, a falta de Inserção dos mesmos, no mundo do trabalho, o acolhimento nos postos de trabalho é muito difícil. A população LGBTI+ sofre diversas violências no ambiente de trabalho, por isso é preciso promover e divulgar as políticas públicas e as leis de proteção, bem como construir programas de inclusão para o mercado de trabalho e empreendedorismo.

Por Lívia Ferreira

Mulher Negra Cis Lésbica, Animadora de Festa, Atriz, Administradora, Conselheira Nacional de Direitos Humanos, Militante LGBTIQ. Sou da Rede Sapatà, UNALGBT, Coletivo LESBIBAHIA, integro a Rede de Mulheres Negras da Bahia e a UNEGRO.